Em alguns municípios brasileiros as Guardas Municipais vêm atuando na
fiscalização do trânsito, função que não está explícita no que é
atribuído às GMs na Constituição Federal, em seu Artigo 144:
§ 8º - Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Essa aparente exorbitância ocorre também porque o Código de Trânsito Brasileiro diz o seguinte:
Art. 23. Compete às Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal:III - executar a fiscalização de trânsito, quando e conforme convênio firmado, como agente do órgão ou entidade executivos de trânsito ou executivos rodoviários, concomitantemente com os demais agentes credenciados;[...]Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição:VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito;VIII - fiscalizar, autuar e aplicar as penalidades e medidas administrativas cabíveis relativas a infrações por excesso de peso, dimensões e lotação dos veículos, bem como notificar e arrecadar as multas que aplicar; [...]
Parece que temos dois impasses (salvo possíveis incorreções de
entendimento jurídico): as Guardas Municipais, com as atribuições que
lhe são dadas pela Constituição, pode realizar o que é atribuído ao
município pelo CTB (função geralmente realizada por superintendências e
agências com Poder de Polícia de Trâsito?). As Guardas Municipais podem
firmar convênios com órgãos executivos de trânsito para realizar a
fiscalização?
A primeira hipótese para menos difícil, mas este impasse está para
ser resolvido pelo Supremo Tribunal Federal, que pretende definir os
limites de atribuição das Guardas:
A aplicação de multas de trânsito por guardas municipais é o mais novo tema com repercussão geral reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), por meio do chamado “Plenário Virtual”. A matéria consta do Recurso Extraordinário (RE) 637539 e, segundo seu relator, ministro Marco Aurélio, “o tema, de índole constitucional, está a merecer o crivo do Supremo”.O recurso foi proposto pelo Município do Rio de Janeiro contra decisão do Tribunal de Justiça do estado (TJ-RJ), que considerou não ser atribuição da guarda municipal a aplicação de multa de trânsito, tendo em vista o disposto no artigo 144, parágrafo 8º, da Constituição Federal.Este dispositivo constitucional prevê que os municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei. Para o TJ-RJ, os municípios não têm poder de polícia de segurança pública e, por conseguinte, as autuações de trânsito lavradas pelos guardas municipais cariocas são nulas de pleno direito.No recurso extraordinário ao STF, o município sustenta que a segurança e a fiscalização do trânsito incluem-se no chamado “interesse local”, previsto no artigo 30, inciso I, da Constituição. O dispositivo prevê que “compete aos municípios legislar sobre assuntos de interesse local”.O município enfatiza também a importância do pronunciamento do STF sobre a questão nos âmbitos social, político e jurídico, “haja vista estar em jogo a autonomia municipal e a possibilidade de desautorizar-se a polícia de trânsito local e, com isso, permitir-se a impunidade de um sem-número de motoristas.”Para o ministro Marco Aurélio, a questão debatida neste recurso extrapola seus limites. “Está-se diante de controvérsia a envolver a Constituição Federal, cumprindo ao Supremo definir o alcance que lhe é próprio. Vale notar a circunstância de a atuação da guarda municipal no trânsito extravasar os interesses do Município do Rio de Janeiro, alcançando tantos outros que a mantêm na atividade”, afirmou o relator. O RE ainda não tem data para ser julgado.Fonte: STF
Outra deliberação do STF, de junho deste ano, que se relaciona com o tema:
O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por unanimidade, a repercussão geral da matéria tratada no Recurso Extraordinário (RE) 608588, em que se discute os limites de atuação das Câmaras de Vereadores para legislar sobre as atribuições das guardas municipais. O artigo 144, parágrafo 8º, da Constituição de 1988 estabeleceu que as cidades poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus bens, serviços e instalações, “conforme dispuser a lei”. Para o relator do RE, ministro Luiz Fux, a reserva de lei prevista no dispositivo constitucional é muito abrangente, por isso é preciso que o STF defina “parâmetros objetivos e seguros” que possam nortear o legislador local.No recurso que será utilizado como paradigma para a discussão da matéria, a Câmara Municipal de São Paulo contesta decisão do Tribunal de Justiça (TJ-SP) que declarou a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei municipal 13.866/2004, que fixa as atribuições da Guarda Civil Metropolitana, entre elas “a atividade de policiamento preventivo e comunitário visando à proteção dos bens, serviços e instalações municipais, bem como a prisão em flagrante por qualquer delito”. Para o TJ-SP, ao tratar de segurança pública, a lei municipal invadiu competência do Estado. Ao sustentar a repercussão geral do tema tratado no recurso, a Câmara Municipal argumentou que a questão ultrapassa o interesse jurídico da cidade de São Paulo, de modo a alcançar diversos outros municípios que têm leis semelhantes.Ao reconhecer a repercussão geral da matéria discutida no RE, o ministro Fux afirmou que a controvérsia contida nos autos gira em torno de objeto mais amplo, sobre o qual a Corte ainda não se manifestou. “Trata-se de saber o preciso alcance do artigo 144, parágrafo 8º, da Lei Fundamental”, afirmou. Fux acrescentou que “não raro o legislador local, ao argumento de disciplinar a forma de proteção de seus bens, serviços e instalações, exorbita de seus limites constitucionais, ex vi do artigo 30, I, da Lei Maior, usurpando competência residual do Estado. No limite, o que está em jogo é a manutenção da própria higidez do Pacto Federativo”, concluiu.A manifestação do relator foi seguida, por unanimidade de votos, em deliberação no Plenário Virtual da Corte.Fonte: STF
Particularmente, acredito que as Guardas Municipais possuem um enorme
potencial para se desenvolverem na atividade de policiamento ostensivo e
preventivo. Muitas delas até já são corporações de excelência na área. O
problema é que a falta de regulamentação e direcionamento adequado tem
permitido em nossas GMs a cultura de equívocos semelhantes aos
existentes nas demais corporações policiais brasileiras. Um exemplo? A
exaltação de “grupos táticos” e todo o aparato bélico-repressivo como única forma de praticar o policiamento.
Que as GMs avancem, mas como polícias comunitárias, preventivas, aproximadas, cidadãs, pacíficas, profissionais.
Autor: Danillo Ferreira -
Tenente da Polícia Militar da Bahia, associado ao Fórum Brasileiro de
Segurança Pública e graduando em Filosofia pela UEFS-BA. | Contato:
abordagempolicial@gmail.com
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